Falei, Foi?
Acabei de olhar de cima para baixo o meu próprio desenho sobre a minha calça.
Estava em pé no trem do metrô.
Muitas pessoas quando vêm os desenhos nos meus jeans, me perguntam se a tinta que eu uso desbota.
Eu quero, almejo, desejo que desbote.
Acho bem mais interessante os traços pretos acinzentarem-se e ficarem mais próximos do tom do jeans.
Prefiro, ao grande contraste.
Interessante que há pouco falávamos sobre o sempre pensado e repensado conflito de gerações.
Como cotidianamente estou cercado pela juventude, fico atento para respeitar alguns posicionamentos que são afeitos a ela, a juventude.
Questões de comunicação me interessam muito.
A forma como os jovens expõe suas ideias, seus palavrões, suas brincadeiras de mão, suas divisões em grupos fechados, suas inovações, entre tantas outras cositas.
Na conversa rápida que tivemos, cheguei à conclusão simplista que nós não éramos tão diferentes deles, apesar de eu ser muito tímido à época, quando o jovem era eu.
Eu quero que a estampa que desenho sobre o jeans, desbote, porém não desejo que desbotem as minhas ideias e meu respeito, não só pela opinião do outro, assim como pelas suas atitudes.
Principalmente sobre as atitudes, o meu respeito fica atento, sabendo que muitas vezes as atitudes têm a minha reprovação.
A minha conversa interior sabe até o momento, que as minhas atitudes em geral requerem movimento, vontade intensa, rapidez de execução, coisa que muitas vezes não observo nessa juventude.
Logo após um moço estar fazendo compras no supermercado, perguntando em vídeo para a esposa qual era o extrato de tomate que ela queria, lembrei-me que eu e minha família moramos um tempo em frente a Cica, em Jundiaí.
Para quem é mais jovem talvez não saiba que a Cica era a produtora do Extrato de tomate Elefante.
Lembrei que ali, eu com seis anos e minha irmã com cinco, íamos à escola sempre com o mesmo ônibus e o mesmo motorista. Sozinhos.
Apenas esse detalhe já constrói um abismo entre mim e a juventude.
Constrói, mas eu não quero que desbote em mim a dúvida, a indagação, o respeito às diferenças, justamente porque a diferença é enorme.
Ao subir a escada rolante que me leva da estação Barra funda até a estação Rodoviária, eu subia segurando no corrimão, mas rapidinho.
Do meu lado esquerdo um garoto de uns onze anos subia correndo a escada rolante, que é gigante.
Quando faltavam uns três degraus ele estava esbaforido e parou na minha frente.
Eu perguntei:
Cansou?
Ele ofegante respondeu que sim.
Esse detalhe me levou à essa escrita superficial, porém instigante.
O mundo mais antigo era muito menos acelerado, o que provavelmente nos fazia mais ágeis para confrontá-lo, em contrapartida esse nosso mundo muito acelerado, talvez torne as pessoas menos dinâmicas, também a fim de reparar nele a aceleração.
Esse talvez, o provavelmente é justamente a questão.
Andamos de mãos dadas com as conjecturas, sendo que sou um adepto frenético dos palpites.
Já coloquei essa premissa muitas vezes para colegas e amigos:
Uma das coisas mais legais de sermos humanos é a capacidade que temos de Darmos Palpites.
É a doação máxima, não esperamos nada em troca, amamos dar palpites.
Ops!
Alto lá.
Claro que não esperamos Nada em troca.
A gente espera Tudo em troca.
Damos palpites porque temos a certeza que a nossa fala é a mais correta e provocará no outro uma mudança radical de atitude.
Rio sozinho.
Lêdo engano.
Não mudará praticamente nada, mas a nossa alegria é imensa só pelo fato de falarmos pelos cotovelos.
Doamo-nos.
Quando o meu ônibus ainda vai demorar meia hora para zarpar, eu sempre peço um café na Casa do Pão de queijo.
Foi o que fiz:
Moça boa tarde, um café pequeno, por favor.
Ela responde:
Um é onze e o outro é doze.
Significa que o pequeno é onze e o médio é doze.
Eu retruquei:
Ah, Você já me falou isso noutro dia.
E ela:
Eu falei, Foi?
Dita essa frase percebi que a moça era outra e não aquela que está ali em todos os domingos.
O sotaque me surpreendeu.
Ela respondeu:
Ah, a Isabeli está lá embaixo hoje.
A moça de cima me serviu o café e eu me despedi dizendo que ia falar com a Isabeli sobre o ocorrido.
Foi o que fiz.
Contei rapidamente e ela me disse que muitos clientes confundem mesmo, mas elas não se acham parecidas.
Parece a questão que levantei acima.
Muitas pessoas confundem, mas as próprias não concordam na aparecência das relações.
Todas as juventudes sâo muito parecidas, porém elas próprias, cada uma a seu tempo, não acham, parecendo esperar o conflito, mas isso é apenas um palpite.
Eu já falei, Foi?
Comentários
Postar um comentário