Adorável

Eu que adoro ver as pessoas na rua e imaginar de onde elas vêm e o que elas fazem da vida, tenho ficado em estado de graça com tantos estímulos visuais.
Rio porque acabei de ser estimulado pela resposta da moça para a amiga.
A amiga tinha dúvida sobre quais as linhas que são de trem e quais as que são de metrô, aqui em São Paulo.
A resposta veio certeira:
Todas as linhas de trem têm nomes de pedras preciosas e todas as linhas de metrô têm nomes de cores.
Imagina você passear tantas vezes pelo transporte público em São Paulo e não saber sobre essa preciosidade.
Não saber e não perceber esse rico detalhe.
Entro no trem da Sé na linha azul indo para a linha vermelha.
Ouço dois moços africanos conversando na sua língua pátria.
Entre tantos sons por mim desconhecidos, ouço um Sorocaba.
Impressionante.
Quase tudo acontece em Sorocaba.
Prefiro pensar em quantos: Boa Noite do jornal Nacional tiveram a ver com a cidade.
Essas reportagens do final do jornal quase sempre foram e são anedóticas, quando relacionadas a Sorocaba.
Por exemplo: A proibição do beijo na praça.
Lembra?
Sensacional foi o dia do Beijaço, promovido pelos artistas da cidade.
Beijos e abraços ecoando pela praça Frei Baraúna.
Veja que isso aconteceu há muitos anos, mas de repente, poderia ter sido ontem, apesar de estarmos no século vinte e um.
Uma cidade conservadora, muitas vezes dos maus costumes.
Cidade de apenas alguns dois ou três cidadãos de Bens.
Acho que ainda tenho apreço pela cidade por algo misterioso, ou por ser também conservador.
Conservador do Caos adequado.
Vou descer a escada rolante e está encostada na mureta uma senhora segurando uma pá de cabo longo e uma vassoura.
Ela dorme em pé.
Não há como eu não pensar em quão cedo ela acordou e se levantou.
Uma casa simples, num bairro afastado, já não é mais uma menina, o café fraco no bule, um pãozinho e margarina.
Imagino quantas linhas esmeraldas, corais, verdes e vermelhas ela usou para chegar até aqui.
E eu viajando no entremear das palavras vindas das sensações.
Sinto que devo me expressar a fim de não me ensimesmar.
Sinto que o condicionamento físico existe e é muito importante.
Amanhã quando sentar no aparelho para o fortalecimento das pernas, no começo será mais difícil, mas instantes depois já estará mais fácil.
Condicionei-me ao fazer artístico e isso me faz sentir que a minha escolha é feliz.
Também lavo loucinhas, corto cebolas e esmago dentes de alho.
O ralador mais interessante que eu conheço é o da Tupperware.
Feito em plástico duro e circular, ele rala que é uma beleza.
Hoje eu nem ralo tanto.
Já ralei bem mais.
Houve época que na noite de quarta para quinta-feira eu dormia três horas no máximo.
Foram dezessete anos assim, indo para Campinas ministrar aulas de Arte.
Houve a madrugada onde a gata Nicole deu cria.
Quatro filhotes.
Nos pés da Mairinha, placenta e gatos e eu não atrasei nem um minuto.
Nesse tempo era chegar na cidade e parar na padaria para tomar um pingado com pão com manteiga na chapa.
Todas as quintas.
Nessa época a Rodovia do açúcar era só neblina até chegar em Indaiatuba.
Não dava para ver as pessoas com tênis botinha verde e surrado, meias de gliter prata, vestido de saco bordado com flores, blusa de linha Off White,  cachecol listrado com cinco cores, pele preta e cabelão maravilhoso.
Não dava nem pra ver o moço com duas calças rasgadas, uma sobre a outra, duas camisas, uma sobre a outra, apoiando com as pernas dois sacos com roupas diversas.
Como intuí que eram roupas?
Os dois sacos eram de plástico e cada um tinha dois furos, de onde saiam pedaços coloridos, que me levaram a entender que eram roupas.
Hoje é dia de Céu nublado e nem por isso eu me queixo.
Eu não queria nem ter uma covinha no queixo.
Nem desentortar meus dentes de baixo.
O Caetano compôs uma canção cujo nome é Queixa e ele se queixa de um amor não correspondido.
Ele repete várias vezes o verso:
Um amor assim delicado.
Quando penso em amor ele deve ser sempre dedicado.
Dedicado à matemática da emoção.
Deixa por minha conta

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