Até pensei

Já escrevi a crônica de hoje e escrevi no busão da Cometa.
Porém, agora que estou na academia, achei apropriado exercitar a conjunção entre as palavras.
Academia física.
Parei pra pensar um pouco e me deu vontade de escrever sobre as pessoas que falam sozinhas.
No caminho que fiz até aqui pude observar umas dez dessas pessoas, que aparentemente falam sozinhas.
Porém, observando mais atentamente pude notar os fones de ouvido, suspensos nas orelhas.
Aqueles com fios que estão totalmente obsoletos.
Lembrei-me do dia que fui assistir a uma palestra e achei o tema sensacional:
A obsolescência do produto.
Sensacional a sensação de termos chegado até aqui e podendo observar as mudanças.
As pessoas parecem falar sozinhas, mas estão a falar com alguém do outro lado da linha.
Linha que por sinal em antanho era relativa aos fios dos antigos aparelhos telefônicos.
É impossível não ouvir as conversas acaloradas e ter a sensação, que todos em volta, atrás e na frente estão obrigatoriamente atentos aos altos papos.
Falando assim parece até coisa feia e talvez até seja.
Ouvir a conversa dos outros.
Então vou falar uma coisa que acho super bonitinha.
Nessas idas e vindas também têm as meninas e as mulheres que andam com os celulares nos bolsos, ou nas bolsas e vêm na minha direção.
Muitas vezes estão com a cara amarrada ou tristonha.
Isso também é feio.
Mas quando elas sentem o celular vibrar, ou tocar e pegam o aparelho, um sorriso largo aparece no rosto e esse resplandece.
Não é fofo?
Não é lindo?
Claro que é.
Tem acontecido mais, mas ainda é raro acontecer com homens, infelizmente.
Acontece sim, porque numa sala de aula, duas meninas perguntaram se eu conhecia tal fulano e eu disse que sim.
Imediatamente as duas ao mesmo tempo disseram em alta voz:
Ah, ele é muito fofo.
Existe.
Manoel de Barros foi e ainda é, muito fofo.
Uma fofura feroz na sua simplicidade.
Fez de uma curva de rio transparente, uma cobra serpenteando o caminho.
No meu caminho até aqui não observo apenas pessoas.
Vou recolhendo pequenas coisas do chão, guardando-as nos bolsos.
Mais tarde elas serão coladas na nossa caixa, onde guardamos os materiais de arte para os alunos mais necessitados.
Nos bolsos estão parafusos, anéis de latas de refrigerantes, pedaços de guardanapos das lanchonetes e restaurantes, entre tantas outras coisas pequenas.
A caixa de materiais vai recebendo coisas coladas até o último dia de aula.
No movimento artístico seria incluída como Assemblage.
E pessoas estão necessitadas não apenas de materiais de desenho, estão muito necessitadas de carinho e afeto.
Ainda há pessoas que apanham com cabos de vassouras, cintos e outras bugigangas que não cabem na Caixa.
É preciso atenção aos detalhes.
E eu peguei no flagra um brinco de pressão estatelado na calçada.
Fiquei a pensar no que a pessoa que perdeu o brinco iria fazer com o par desfeito.
Acho que mandaria fazer uma moldura Caixa e colocaria o solitário bem no centro, cobrindo tudo com vidro.
Ficaria em exposição na sua estante.
Ou então sairia de casa, super pós moderna, com um brinco diferente em cada orelha.
Ou ainda colocaria em penhora na Caixa econômica e receberia dez reais para comprar um Sundae grande no Méqui.
Pera aí.
Ainda teria que morrer com mais dois reais para obter o produto?
Essa gíria é interessante, afinal se morre mesmo com a quantia despendida.
Assim nos ensinou o Mestre Mujica:
É com o tempo da nossa vida, gasto com o trabalho, que conseguimos Plata para comprar las cosas.
Portanto, há que pensarmos bem em como estamos vivendo a nossa vida.
Talvez até como uma vida de brinco solitário, encontrado no chão.
Porém, como roga esse texto paupérrimo, ainda nos resta algumas possibilidades pós modernas de mudança no quadro.
Misturar ferramentas com abraços, notas fiscais com mais beijos e muito mais dinheiro com as causas da fome.
Quando tudo parece tão sombrio, feito um micro-ondas que dá um estalo e para de funcionar, aparecem três possibilidades de trocar a peça queimada.
Comprar uma zero bala, uma pirata e uma remanufaturada.
Escolhi a remanufaturada em duas vezes no cartão.
Remanufaturada significa que alguém especializado pôs a mão e consertou a dita cuja.
Vamos por a Mão na consciência, manufaturando-a.
Podemos até falar sozinhos, mas que tenha alguém por perto nos escutando

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