Pega Eduarda, pega!

Tenho pouca lida com situações de mães, ou pais impacientes com seus filhos pequenos, agindo na criação quase como uma obrigação.
Enquanto tomava meu pingado sentado no balcão da pastelaria Chinesa, fui despertado por uma fala áspera e ruidosa:
Fala o que você quer Caraio!
Virei meu rosto para ver de quem se tratava.
Imaginem uma menininha de uns seis anos, com trancinhas no cabelo, calça e botinha, calada pela mãe desesperada, repetindo duzentas vezes:
Mas o que você quer menina?
Entre as repetições, um murmúrio: Como dá trabalho criar essa criança.
E a pequena só ali, apontando o dedinho para a carinha da raposa na embalagem das balinhas.
A mãe comprou um saquinho de qualquer outra coisa e ordenou que a menina segurasse.
Como eu já disse, muitas graças por eu ter pouco contato com esse tipo de cena e total ciência que é muito difícil criar bem qualquer criança.
Lembrei de quando ia a pé da estação do Metrô e via inúmeros cartazes só com uma palavra escrita em estilo Art Nouveau cobrindo o cartaz inteiro.
BAGARAI
A Palavra como imagem.
Passei meses vendo a imagem repetida na parte de trás das bancas de revistas da Avenida Faria Lima e também em outros cantos, questionando se seria um anúncio de um Show, uma peça teatral, entre outras possibilidades.
Como me acontece sempre, demorei um tempo para que eu Visse.
Normalmente estou do outro lado da rua, como aconteceu quando vi que o X da Caixa econômica federal é um S de cifrão, cortado pela parte cor de laranja.
Como o símbolo do Carrefour ser um C e as laterais vermelha e azul serem duas setas, afinal Carrefour significa encruzilhada e os dois Bs minúsculos formando o cifrão do Banco do Brasil.
Enfim.
Num dia especial, vi do outro lado da rua a parte de trás de uma banca e percebi o que queria transmitir o Cartaz:
BAGARAI, como se vc dissesse rápido:
PRA CARAIO!
Era apropriado para a mãe nervosa poupar o nosso espírito.
No Uber que me trouxe de casa, o moço chama-se John, que é nigeriano.
Uma simpatia.
Há vários nigerianos trabalhando no nosso colégio.
Achou graça quando disse que trabalho como Artista e professor de arte e me disse que adora desenhar.
Conversa boa Bagarai.
Antes de chamar o uber resolvi que ia com um par de meias cinza que é grande Bagarai para o meu pé e só uso pra dormir.
Foi quando olhei para a banqueta que fica grudada na parede e vi o molho de chaves de São Paulo.
Na mesma hora percebi que havia colocado a mochila à noite sobre a banqueta e ela caiu no chão.
O molho quedou-se deitado sobre a dita.
Tive preguiça de levantar e deixei a mochila dormir ali mesmo, no carpete.
Beleza.
Depois de chamar o Uber, quando fui andar já calçado, reparei que a sobra da meia do pé direito estava me incomodando.
Ainda com certa preguiça pensei em sair assim mesmo.
Porém me enchi de coragem e sentei na cama pra trocar as meias.
Pequei um par justinho e quando fui tirar as cinzas, vi que o que deixou o meu pé desconfortável não era a meia folgada, era o mosquetão que fazia parte do chaveiro.
Na queda de ontem à noite, o mosquetão foi se alojar dentro do sapatênis.
Já ouvimos muitas vezes frases motivacionais que nos inspiram a levantarmos com energia após uma queda, porém essa também é uma tarefa difícil Bagarai.
Desejo boa viagem para a garotinha e sua mãe nervosa.
Calculo que estão embarcando para o Rio Grande, já que ouvi um Tchê num final de um grito.
Ao meu lado, enquanto espero uma montanha de gente embarcar no meu ônibus, como já escrevi noutro texto, ouço um pai e sua filha dizendo com sotaque carioca que eles ainda têm muitas horas de viagem até o Rio.
O pai, achando que a perna da pequena filha estava me incomodando disse:
Filha, por favor, tenha modos com as pernas.
Há modos e modos, jeitos e jeitos e ainda guardo sorrisos para a boa educação.
Acho isso Lindo.
Lindo Bagarai

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