Elevadores

Ao entrar no prédio me deparei com dois elevadores.
Um ao lado do outro.
Na minha experiência, o da esquerda quase sempre está quebrado.
Num dia de sol a pino ele ficou parado entre dois andares.
Num outro dia mais nublado ele chegou no nono andar e demorou um tanto para abrir a porta.
Já o elevador da direita tem até um mostrador digital, super moderno, mas ele estava indicando estar no sétimo andar, chamado pela senhora sabedora das letras e das canções.
Cheio de esperteza e coragem entrei no elevador da esquerda que estava parado no térreo.
No início da caminhada ouvi um som ritmado como se a gente batesse num prego, ou compusesse uma melodia engatada numa letra de repetidas sílabas encantadas pelo toc toc.
Foi tudo rápido e como apareceu, sumiu.
Mais um andar e o som agora passou a ser suave e longo, como uma caminhada de quem pisa num asfalto recém colocado, quase perfeito, passo a passo certeiro, como se a música andasse pelo nosso coração entusiasmado.
Terceiro andar e uma terceira perspectiva de um olhar atento, percebendo os detalhes de uma mente ocupada com gentilezas, na sutileza das ações dos gestos e dos pequenos textos.
No quarto, a memória de sentimentos bonitos, daqueles que amansam as feras dos contos de fadas e duendes e dos Edgares Alan Poes.
Quinto andar acaba por ser motivo da ideia de um comunicador que ama comprar e vender imóveis e o som passou a ser mais ralado, como se o metal se esfregasse em outro sem movimento.
Como se a gente se esgueirasse pelas barras dos problemas e os enfrentasse com malemolência.
Os gatos têm esse costume e quase sempre se dão bem na empreitada, sendo até alvos de cliques e curtidas nas tais redes sociais.
Sexto andar e aquela relação fácil que a gente costuma fazer com a chapeuzinho vermelho levando frutas para a vovozinha.
Outra relação facílima é aquela que fazemos com o basquete, afinal acabamos de nos classificar para as olimpíadas de Paris.
O som já se confunde com a Art Nouveau, mesmo que o albino Hermeto já tenha um pouco mais de oitenta anos de juventude sonora.
Sétimo céu era uma revista que tinha até fotonovela.
O cinema dizem que é a sétima Arte e ele pode ser motivado muitas vezes pelos sete pecados capitais, os sete palmos de terra, os sete anões e o sétimo andar num elevador.
Uma oitava acima está o som do oitavo andar.
Um contralto e um soprano unidos pelos cabos de aço paralelos.
Aqueles que não podemos ver, estando dentro da caixa que sobe e desce.
Chego no andar proposto no início dessa andança.
O Nono.
E como não pensar no meu avô italiano e confeiteiro que antes de chegar nesse Brasil, fazia máquinas de escrever em Turim.
Ao chegar, antes de abrir a porta, o som era o dos metais em percussão, como o tilintar dos dedos do nono nas teclas de uma Olivetti: teclas A, M, O e R.
A caixa parada mostra - mesmo nessa cidade Metrópole - o som de bem-te-vis estacionados nos fios do outro lado do vidro.
Proponho uma elevação do nosso espírito.
Andar por andar, caminhar por caminhar, que possamos nos elevar acima dos medianos.
Quando retornarmos ao térreo, que retornemos munidos desse nosso elevado estado de consciência, que percebe os sons que rodeiam nossa imaginação.
O térreo nos presenteia com o vasto campo coletivo, onde compartilhamos nossas ideias para que possamos ser bons ascensoristas

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Rima

A saga das palavras

Escolhas