Parecia, mas não foi a voz de um sino
Foi como se eu ouvisse de longe.
Um som que não era nada como o som do trovão após um relâmpago.Não era.
Era exatamente como o som de mil toques seguidos do bico fino de um beija-flor numa só pétala da flor da dama da noite.
Sabemos que o que procura o bico do fino pássaro é o centro da flor, porém ao se ver ansioso pelo centro, não há como ele não tocar a pétala de forma sutil, beijo de mil vezes.
Esse foi o som.
Esse do suave toque, não o do trovão branido após o clarão numa noite sem estrelas.
Dizer sem estrelas nesse contexto é como dizer sem palavras nesse texto.
Eu desejo que ele esteja muito além das palavras e do som estridente do tocar na tela em busca das letras.
Sou atendido nesse desejo.
O som é leve e como disse o João, muito leve, leve pousa.
Dadá Maravilha já nos disse que ele pairava no ar como um beija-flor.
E pairava até o momento da bola tocar docemente a rede nos seus gols de cabeça.
Na minha cabeça paira o som leve e suave que talvez não viesse de um sino, mas vinha de longe, com certeza.
Pensa num som que de tão longe soa tão perto.
Pensa num papel guardado há tempo numa gaveta, sem uso.
O papel e a gaveta.
Num repente, uma outra mão abre a gaveta e o papel é entregue às suas mãos de artesão.
O som é tão sensível que você o transpõe para a pele bege, antes branca da folha que nem lembrava mais dos pelos do pincel estrangeiro.
Sim, vindo de tão longe e sentido tão perto.
Ao abrir o envelope pardo vejo dentro o postal engenhoso onde transborda a imagem de um casa grande, antiga e habitada.
Ao lado uma igrejinha com uma pequena torre onde há anos se pendurava um sino minúsculo, mas ardente.
Não há mais sino no postal.
O que há é um espaço cúbico, feito caixa aberta em buracos para janelas.
De onde enquadrariam janelas, não há jardineiras onde poderiam germinar hortênsias.
Há buracos por onde o ar transita e ousa transbordar qualquer som, ou bramido.
Daqui de longe eu não ouço tudo isso.
Isso eu vejo e até toco.
O que eu ouço é o som terno que vem de longe e de tão longe bate perto, perto, mais perto.
Perto e mais perto.
E não para.
Soa, soa, voa
Eterno
Comentários
Postar um comentário